12 de março de 2014

True Detective

A HBO emplacou mais um sucesso que evidencia o grande momento vivido pela TV em contraste com o cinema. O último episódio de True Detective exibido domingo (09/03), gerou a queda do serviço on line do canal no momento de sua exibição, tamanha demanda dos fãs em acompanhar o desenrolar da minissérie. Três pontos se destacam para o sucesso da série que vem sendo apontada como a melhor série nova da temporada. O primeiro ponto é o cuidado que a HBO tem com seus seriados, em segundo lugar a estreia de Nic Pizzolato como roteirista que nos presenteou com um trabalho tão bem escrito quanto obras literárias de prestígio, por fim a atuação assustadora de Matthew McConaughey, vencedor do Oscar 2014 por Clube de Compras Dallas, o texano obteve o melhor desempenho de sua carreira em True Detective.

McConaughey e Harrelson
Pizzolato comentou a proeza de escrever todos os oito episódios da primeira temporada dizendo: “Não tenho o menor interesse em me matar para escrever um roteiro e entregar para um produtor estragar tudo. Queria injetar uma sensibilidade de romance. Falam que a TV possui narrativa literária, mas não é bem assim. Livros têm final e a maioria das séries só começa a pensar no fim quando anunciam o cancelamento.” Em um misto de ocultismo com sectários insanos e cruéis e a promessa de um paraíso negro em outra vida o roteiro se desenvolve. Rustin Cohle (McConaughey), detetive pessimista e Martin Hart (Woody Harrelson) seu parceiro e contraponto otimista, investigam um estranho assassinato. Michelle Monaghan vive Maggie Hart a esposa de Hart e elo entre os dois parceiros.

Entre as influências estão o livro de Robert W. Chambers (1865-1933) O Símbolo Amarelo e Outros Contos (1895), a série cult de David Lynch Twin Peaks (1990-1991) e inúmeras citações filosóficas. O pessimismo de Rustin, evoca o filósofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860), e curiosamente é o que mais se aproxima da realidade do mundo em que vivemos, em um dos episódios ele diz ser injusto trazer uma vida da inexistência para “isso?”, indo de encontro às crenças de Schopenhauer que em seu livro O Mundo como Vontade e Representação (1819) diz: “Há momentos em que as crianças parecem inocentes, como prisioneiros condenados , não à morte , mas à vida, e ainda todos inconscientes do que isso significa . No entanto, todo homem deseja viver, mas um estado de vida em que diremos: "Hoje foi um dia ruim e amanhã será pior, assim por diante até que o pior de tudo aconteça."” Seus questionamentos por mais pessimistas e depressivos que possam soar, são os únicos alentos que trazem um real propósito para a vida e para o mundo em que homens se matam afim de satisfazerem e comprovarem suas crenças.

Confira a abertura de True Detective:


Nietzsche (1844-1900) também é citado em diversos momentos como na citação de Cohle em que o tempo é um círculo plano, incitando a lei do eterno retorno e tratando a verdade como sinuosa. Cohle se deleita de seu espírito ateu niilista e totalmente descrente da vida: “A morte criou o tempo para desenvolver as coisas que pode matar.” Seu pessimismo está fundamentado na tese de que o otimismo apenas vê o mundo com bons olhos, mas nada cria, o realista cria o que precisa para o momento e apenas o pessimista cria todo o tempo, por sua dinâmica perfeccionista que nunca está convencido de nada, este é o combustível que move McConaughey a nunca descansar. Os conceitos de pessimista e otimista foram estereotipados e rotulados pela sociedade, hoje são apenas enlatados que recebemos como brinde na compra de livros de autoajuda, Pizzolato deu nova voz inquietante e perturbadora encenando seus conceitos de forma agressiva e obscura. Uma obra de arte completa.

Plano sequência de seis minutos espetacular:

Outro destaque é a trilha sonora, sobretudo a abertura que impacta desde o primeiro acorde. A canção Far From Any Road inclusa pelo vencedor do Oscar T Bone Burnett, produtor musical do seriado, e interpretada por The Handsome Family foi tirada de um álbum de 2003 e parece ter sido escrita especialmente para o seriado. O plano sequência de seis minutos do quarto episódio, sob a batuta do diretor Cary Fukunaga, já é considerado um dos melhores da história. True Detective definitivamente entra no rol seleto das melhores séries de todos os tempos e suscita com verdade o velho ditado popular: o que é bom dura pouco!


True Detective (2014– ) on IMDb

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