16 de outubro de 2013

A Caça (2012)

Escrito e dirigido por Thomas Vinterberg, A Caça (Jagten) usa como estopim moral o abuso sexual que explode numa trama intricada e revestida de hipocrisia e valores conservadores. As discrepâncias sociais e comportamentais com base nos juízos de valor definidos pela cultura milenar dinamarquesa são o mote da história. Vinterberg ganhou notoriedade após o longa Festa de Família (1998) que também aborda abuso sexual, desta vez o patriarca é o alvo do drama que desce mais amargo que A Caça. Mads Mikkelsen interpreta Lucas e não lembra nem de longe o cínico Hannibal Lecter do seriado Hannibal, ao contrário, sua atuação brilhante é digna de pena e reflete as injustiças cometidas contra seu personagem. Mikkelsen ganhou o prêmio de melhor ator por seu papel no Festival de Cannes em 2012. É o indicado da Dinamarca para concorrer ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2014. O filme conta ainda com a atriz mirim Annika Wedderkopp e com o veterano Thomas Bo Larsen.

O método de condução da trama que não esconde os fatos reais do público é proposital para que o foco principal se vire para o comportamento daqueles que foram afetados pelo abuso, se fosse de outra forma agiríamos de modo a culpar o agressor e o foco recairia em como ele deveria ser punido, sendo ou não culpado. Fatores psicológicos interferem de forma decisiva para a formação do caráter e atitude da pequena Klara (Annika Wedderkopp), os constantes desentendimentos familiares criaram a fobia de rejeição e abandono, ela então enxerga em seu professor um porto seguro. O contraste emocional destacado por Vinterberg chama atenção, Klara é uma criança sem muitas referências emocionais, quando seu irmão a mostra pornografia isso a deixa irritada, motivo pelo qual ela decide usar esse argumento para se “vingar” de Lucas por sua rejeição. Características psicológicas abordadas de forma genial por Vinterberg.

Produzido e rodado na Dinamarca, A Caça possui nuances culturais que se aproximam e diferem das nossas. A cerveja é mais forte que a nossa e consumida em toda e qualquer ocasião principalmente em encontros familiares. Os amigos representam a família em uma sociedade unida em todas as circunstâncias, eis o ponto de apoio da história. Vinterberg constrói uma relação de amor e carinho e de repente rompe essa realidade mudando a direção da trama. As caçadas seguem a tradição cultural e são herdadas de pai para filho. São vistas como um ritual para a idade adulta e é possível notarmos uma mensagem oculta por Vinterberg a relação do sexo com o término da puberdade. A perda da inocência aqui vai além da castidade e adentra questões que abordam o bem e o mal, o certo e o errado.

Confira o trailer:


A pedofilia hoje é um dois motivos de maior asco na sociedade mundial, fato que é o ponto de partida para o comportamento conhecido como “manada” adotado pelos personagens. A hipocrisia presente nas relações sociais dinamiza não uma sociedade às avessas com o próximo, mas sim um grande esforço em condenar alguém, para aliviar o peso da culpa que cada um carrega pela negligência de diversas formas e fatores, como educação, segurança e ambiente sócio familiar, que contribuem diretamente para a formação de caráter e pela ausência dele.  A Dinamarca é um dos países com maior índice de estupros do mundo e o primeiro em distribuição de renda, dado que aproxima muito as pessoas e comprova que crimes desse aspecto não são exclusividade dos países pobres. A maldade está presente em todas as culturas e classes sociais assim como a chuva que molha tudo que estiver desprotegido.

E que o cinema esteja com vocês!


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