Li outro dia, no blog português
Obvious, um artigo sobre o clássico Laranja Mecânica. O texto discorre sobre os
dois finais existentes na história. No campo de comentários surgiu o assunto do
lado negro da laranja. Pensando sobre esse “Dark Side of the Orange” me vi às
portas do existencialismo sartriano. A história de Anthony Burgess e a
adaptação feita para o cinema por Stanley Kubrick contextualizam duas versões
da mesma laranja. Discorro agora sobre as duas partes da
Laranja Mecânica.
Entre o fim do livro e o fim do filme
existem dois finais, no livro Alex, líder da gangue, é recuperado através do
Tratamento Ludovico. No filme, após sua prisão e à aversão assistida à base de
drogas e exposição a filmes de violência, ele ainda permanece como dantes, um
arruaceiro.
Uma das cenas mais horror show do cinema |
Alex, que no cinema teve seu papel
interpretado por Malcolm McDowell, tem seu lado negro exposto durante suas transgressões,
tal como uma das cenas mais perturbadoras da história do cinema, ele e sua
turma invadem a casa de um escritor e estupram sua esposa, enquanto Alex canta
e dança Singin’ in the rain.
Para a maioria dos fãs de Laranja
Mecânica, a versão de Stanley Kubrick é a mais aclamada, por manter Alex com
seu lado negro. Enquanto no livro de Anthony Burgess ele se regenera e se
purifica. O lado negro não é bem um lado negro e sim a essência de Alex, que
por definição é má. O outro lado é resultante das sequelas pós-traumáticas
sofridas por ele no decorrer de seu tratamento. Jean Paul Sartre, filósofo
francês do século passado e precursor do movimento existencialista, afirmava
que a existência precede a essência, ou seja, primeiro existimos depois
ganhamos nossa essência, que pode ser influenciada pelo meio em que vivemos,
mas jamais alterada.
Imaginem uma laranja. Ela cresce em
uma laranjeira e quando amadurece revela um suco adocicado e rico em vitamina
C. Essa é sua essência. Se utilizarmos a laranja como bola de
futebol, ainda assim ela será uma laranja. Se colocarmos sal em seu suco ele
ficará amargo, mas sua essência permanecerá doce. Dessa forma afirmo que não há
um lado bom em Alex, sua essência jamais foi alterada, seu lado negro apenas
foi pintado de branco, mas sua escuridão permanece lá. Portanto a versão criada
por Kubrick está mais contextualizada e pertinente à personalidade de Alex,
talvez por isso seja tão cultuada no mundo.
Dizer que a existência precede a
essência é afirmar um antiteísmo, mas se Deus criou primeiro a essência, o
homem nasce bom e, como afirmou Jean-Jacques Rousseau, a sociedade o corrompe.
Quem corrompe a sociedade é o mal. Sendo assim seríamos apenas vítimas do mal,
mas como afirma Sartre, o homem é o único responsável pelo que é. Portanto não
creio em um lado negro de Alex, mas sim em sua essência.
Anthony Burgess escreveu Laranja
Mecânica (A Clockwork Orange) em 1962,
com uma grande preocupação com o behaviorismo, que estava em alta nas clínicas
psicológicas, e com o aumento da delinquência juvenil, tanto na Rússia
Soviética, quanto no Ocidente capitalista. O idioma nadsat utilizado por Alex e seus drugues também foi criado por Burgess, uma mistura de russo com
gírias inglesas. O último capítulo do livro foi suprimido em inúmeros países do
mundo, por mostrar um Alex recuperado. Em 1971 o gênio Stanley Kubrick adaptou
o livro para as telas do cinema, dando cor ao krovvy e vida à ultraviolência.
Que o cinema esteja com vocês!
Acredito nas transformações psicologicas do ser humano,parcialmente,afinal vivemos num mundo onde milhares de coisas nos influenciam por avos de segundos,mas acho muito dificil alguem possa mudar sua essencia por completo.O que ocorre é uma adição de novos valores bons com o que Há de ruim em vc,o bom se sobrepõe mas o mal ainda está lá como uma balança do bem com o peso do mal,mudar por completo seria necessario morrer e nascer novamente com uma memoria totalmente nova ou uma lobotomia ,o que pra mim é impossivel,até religiosamente falando.ass deka marques
ResponderExcluirSorry os erros Kkkk Estou dependente um bendito tablet rsrs queria poder expressar melhor a ideia da essencia ,amei o post. ass:deka
ExcluirOlá Deka, seu comentário foi muito agregador à ideia do post. Sinta-se em casa e não se preocupe com os erros!
ExcluirQue o cinema esteja com você!
Filme marcante, mas o qual não dá vontade de rever. Não é preciso, pois se imprime em nossa retina interna e é fácil rememorá-lo. A trilha sonora é a única parte realmente boa do filme, executada em sintetizador Minimoog por W. Carlos. O escopo filosófico do filme é pilantra, pois faz tábula rasa da natureza humana com conceitos parciais. O ideia platônica da essência precedendo a existência é a mais próxima da verdade, assim como a formulação de Rousseau que a espelha nesse ponto (admitir isso é fora de moda hoje em dia, e o filme, em termos de ideias, é só mais do mesmo e enterra o debate sério). Plasticamente e em termos de linguagem, Laranja Mecânica é muito forte, como só Kubrick poderia tê-lo feito. Emerson, a sua postagem me instigou a ir atrás do livro. Obrigado e continue!
ResponderExcluirOlá Evaristo.
ExcluirDigo até que falhei em não citar a trilha sonora, a fixação de Alex por Beethoven... Seu comentário foi enriquecedor e sua distinção quanto à filosofia e força implantada em nossa retina figurou pra mim como um discurso daqueles que existiam nos bares franceses à época de Hemingway, Picasso, Fitzgerald e tantos outros... Seu comentário me instigou a continuar em frente, pois sabendo que terei leitores como você e que essa experiência fará com que todos nós cresçamos. Obrigado e seja bem vindo!